Entenda como a PEC Emergencial afeta servidores públicos
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Entenda como a PEC Emergencial afeta servidores públicos

PEC Emergencial prejudica serviços públicos

A Câmara dos Deputados aprovou, em tempo recorde, na madrugada desta sexta-feira (12), a chamada PEC Emergencial (186/19) em segundo turno. A proposta obteve 366 votos a favor e 127 contra; três deputados se abstiveram.

A tramitação atropelada é resultado de uma manobra do governo Bolsonaro, que atrelou a aprovação da PEC à recriação de uma versão desidratada do auxílio emergencial.

A proposta, que prevê medidas de ajuste fiscal, permite ao governo pagar o novo auxílio com R$ 44 bilhões fora do teto de gastos. No ano passado foram R$ 320 bilhões. Assim, hoje, com o dobro de mortes diárias e uma piora significativa no quadro geral da pandemia, aprova-se um valor quase 8 vezes inferior destinado ao pagamento do auxílio.

O que foi aprovado

A PEC Emergencial (186/2019foi apresentada por senadores governistas em 5 de novembro de 2019. Ela faz parte de um pacote de medidas chamado Plano Mais Brasil, que é formado por outras duas PECs: a PEC do Pacto Federativo e a PEC dos Fundos Públicos. Segundo o governo, seu objetivo é equilibrar os gastos públicos.

Após alterações, as três Propostas fundiram-se na PEC 186/2019, aprovada em dois turnos pelo Senado Federal antes de seguir para a Câmara dos Deputados. Ela altera a Constituição para estabelecer alguns “gatilhos”, instrumentos que podem ser acionados pelo governo para promover ajuste fiscal em caso de crise das contas públicas.

Inicialmente a proposta previa redução forçada de salários e jornada de servidores, bem como a desvinculação e desidratação de recursos para saúde e educação, o que foi revisto. Mas permaneceram dispositivos que apontam para o subfinanciamento das políticas públicas bem como congelamento de salários e concursos no serviço público por 15 anos.

Calamidade pública inserida na CF

A PEC altera a Constituição (artigo 167-B) para dizer que é necessária proposta do presidente da República, com anuência do Congresso Nacional, para decretar estado de calamidade pública.

Pelo texto, fica estabelecido que, no estado de calamidade, a União deve adotar regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender às necessidades do momento. Os gastos com a emergência ficam de fora das regras fiscais, mas salários e concursos são congelados em caso de decretação da calamidade.

Este ano o governo ainda não decretou calamidade, mas as remunerações no serviço público já estão congeladas por força da Lei Complementar 173/2020.

O que muda para os servidores

A PEC também altera o artigo 109 ADCT da Constituição (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) para determinar que, quando as despesas obrigatórias sujeitas ao teto de gastos (gastos com salários, previdência, abono salarial, por exemplo) chegarem a 95% das despesas totais no período de 12 meses em cada Poder, a União é obrigada a ativar alguns “gatilhos” para contenção de gastos.

Dentre eles está o impedimento de aumentos e reajustes de salários dos servidores públicos, impedimento de criação de gastos de funções, impedimento de alteração de estrutura de carreira, admissão e contratação de pessoal, impedimento de realização de concursos públicos, criação de auxílios e outros.

Estados e municípios devem seguir a mesma regra, porém com algumas diferenças. Nos governos locais, as medidas de contenção deverão ser ativadas quando as despesas correntes representarem 95% das receitas correntes (como arrecadação de impostos).

A PEC coloca esse acionamento como facultativo a estados e municípios, no entanto, os governo locais que não ativarem essas medidas não recebem garantias da União para tomada de empréstimos, por exemplo, além de não poder contrair novas dívidas com outro ente da Federação ou mesmo renegociar ou postergar pagamentos de dívidas existentes. Na prática, isso impede o investimento em serviços básicos para a população, como saneamento básico, por exemplo.

Esse ponto é extremamente prejudicial aos funcionários públicos e, consequentemente, a toda a sociedade que acessa o serviço público. Sindicatos alertam que a categoria poderá ficar sem reajuste salarial até 2036 com a aprovação da PEC.

Esses gatilhos, somados ao impedimento de investimentos trazido pelo Teto de Gastos, é uma bomba para o Brasil em tempos de crise. Para Bráulio Cerqueira, presidente da Unacon Sindical, “num momento em que o mundo amplia gastos públicos para salvar vidas, nós antecipamos cortes de despesas cruciais à manutenção dos serviços à população, além de destruir no longo prazo o emprego público. Na União, a PEC 186 torna mais rígido o teto de gastos. Em Estados e Municípios, a PEC atrela cortes à redução de receitas, que já está ocorrendo em meio à crise, um desastre. O problema dos resultados fiscais não é dedescontrole de despesas, mas de crescimento econômico, que será prejudicado pelo arrocho”. Ele também manifesta sua apreensão com a falta de dados e projeções sobre o impacto da PEC não só sobre servidores públicos, mas também sobre a população em geral.

Pedro Pontual, presidente da Anesp, argumenta contra a PEC nesse mesmo sentido. “O mínimo é submeter uma proposta como essa ao que a gente chama de análise de consistência, pra ver se ela se sustenta em outros cenários que não o imaginado. A gente nunca vê estimativas formais do Ministério da Economia. Estamos vivendo um problema grave de falta de planejamento para mudanças na Constituição”, diz.

A economista Laura Carvalho, em seu perfil no Twitter, afirmou que a regra “é péssima pois estabelece mais um limite fiscal no emaranhado de regras que nós temos sem qualquer racionalidade e estabelecendo de antemão as prioridades no corte de gastos públicos para um próximo governo”. Para ela, a PEC não resolve a insustentabilidade do teto de gastos e deixa o ajuste fiscal para o sucessor, podendo levar a congelamentos de salários de servidores.

É importante lembrar que, ao contrário do que diz o senso comum, a maioria dos funcionários públicos não ganha supersalários, nem goza de privilégios infinitos. Esse impacto será sentido principalmente por professores e profissionais de saúde, que prestam um serviço essencial à população.

Já que a Câmara apenas suprimiu trechos do texto-base e não houve alteração do texto recebido do Senado, a proposta aprovada deve seguir para promulgação.