Secchi e Teixeira: perspectivas sobre a estabilidade do servidor
Debate

Secchi e Teixeira: perspectivas sobre a estabilidade do servidor

Trajetórias e perspectivas sobre a estabilidade do servidor público: contribuições para a reforma administrativa

Para ao Estadão, os professores Leonardo Secchi e Marco Antonio Teixeira escrevem sobre o debate em torno da estabilidade funcional dos servidores, que voltou à agenda pública por causa da proposta de Reforma Administrativa do governo Bolsonaro.

No texto da PEC são propostos novos tipos de vínculos para os servidores públicos que, na prática, restringem a estabilidade para futuros servidores, com exceção daqueles que ocuparem cargos das carreiras típicas de Estado.

Os autores apresentam as narrativas em contraposição sobre a estabilidade: 1. A favor da estabilidade, com argumentos de que esta garante proteção aos servidores públicos contra perseguições políticas e manter a isonomia no tratamento entre servidores. 2.Contra a estabilidade, com o argumento de que esta leva à perda gradativa de motivação, criação de sensação de impunidade, como uma das forças de incremento crescente dos gastos públicos e diferença de tratamento em relação à iniciativa privada.

Eles explicam que a estabilidade funcional dos servidores tornou-se uma política de gestão pública no Brasil há pouco mais de 100 anos. O problema diagnosticado, antes, era o arbítrio, a pressão e a perseguição política, herança de um Estado patrimonialista.

“Era mister, portanto, criar uma classe burocrática estável, que pudesse se proteger de abusos políticos e dar continuidade às políticas públicas em implementação, independente do governante e do partido de plantão”.

Passados mais de 20 anos desde a última Reforma Administrativa, contexto em que foi elaborada a PEC 32/2020, será que a Administração Pública está madura o suficiente para superar o instituto da estabilidade? Superamos a arbitrariedade política? Para os autores, a resposta é não.

Secchi e Teixeira também frisam que a “dose” de estabilidade também não deve ser a mesma em toda a Administração Pública brasileira. “Se tivéssemos uma escala de maturidade organizacional, burocrática, institucionalizada em corpos burocráticos autoimunes à interferência indevida de alguns agentes políticos, poderíamos apontar em quais organizações públicas poderiam ser relaxadas contingencialmente ‘as doses’ de estabilidade. Como ainda não temos tal escala, restou ao elaborador de política pública (Ministério da Economia) e aos legisladores (Congresso Nacional) a difícil tarefa de criar uma linha de corte, para quem permanece com regime estatutário com direito à estabilidade, e quem, no futuro, passará a ocupar cargos na Administração Pública de característica mais precária.”

A linha de corte fica na definição das carreiras típicas de Estado, tarefa que o governo passou ao Legislativo com a PEC 32/2020. Os autores salientam que isso pode se tornar um constrangimento, já que pode se tornar uma legislação-bomba no futuro.

 “Caso aprovada a PEC, serão afetados aqueles futuros servidores que mais precisarão da estabilidade para fazer frente a seus difíceis contextos político-culturais. No Atlas do IPEA, estes servidores de áreas sociais respondem por 46,9% do total de servidores do Brasil e são representados pelos professores, agentes de saúde, assistentes sociais, entre outros das redes municipais e estaduais”.

A PEC, como foi redigida, tem foco em restringir a estabilidade de acordo com o tempo de serviço, por âmbito da Administração Pública, por Regime Jurídico e por período de ingresso. A combinação dessas dimensões pode ser prejudicial à administração Pública e à sociedade por fragilizar as categorias que estão na linha de frente da prestação de serviços públicos: saúde, educação, segurança, assistência social, entre outras.

“Para uma atualização do estatuto da estabilidade, uma linha promissora na combinação das dimensões e critérios é aquela que envolve a segunda dimensão apresentada, a avaliação de desempenho. Em outras palavras, a estabilidade deixar de ser um critério identitário (ex. tipos de carreiras, pertencimento a órgão), para passar a ser um critério condicionado a prestações individuais ex post”, escreve.

Secchi e Teixeira acreditam ser fundamental desenhar um sistema de avaliação de desempenho e também de gestão de desempenho na Administração Pública brasileira que encontrem respaldo legal e aplicação customizada no “mosaico” administrativo brasileiro.

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